Sociedade do Cansaço de Byung-Chul Han reflete sobre como nosso tempo está moldado no conceito de desempenho constante e os impactos disso.
Se juntarmos isso com a compreensão que nos tempos modernos o mercado de trabalho – que também exige desempenho constante –, está intrinsecamente ligado à nossa identidade e autoestima, podemos compreender o crescimento de doenças e distúrbios mentais dentro do mercado de trabalho.
Dessas doenças mentais, inclusive, as mais comuns são a depressão, o burnout, a ansiedade e o transtorno do déficit de atenção.
Isso porque, como Han descreve, a “Sociedade do Cansaço” é uma era na qual a cultura de desempenho e produtividade se tornou a norma onipresente, dentro e fora do trabalho.
Em contraste com a sociedade disciplinar apresentada por Michel Foucault, onde a obediência externa prevalecia, na sociedade do cansaço, os indivíduos internalizam a pressão para alcançar constantemente mais, resultando assim na exaustão física e mental.
Portanto, nesse contexto, não precisamos mais do carrasco externo, ou do opressor externo, essas figuras são encarnadas por nós mesmos, pela nossa mente e pensamentos.
Por isso podemos ser bombardeados com pensamentos e sentimentos como:
- Será que estou fazendo o suficiente?
- Será que estou fazendo todo o possível?
- Será que estou sendo produtivo?
- Me sinto inútil mesmo depois de um dia inteiro de trabalho.
- Me sinto cansado, mas não fiz nada hoje.
- Me sinto mal porque outros estão produzindo muito mais que eu.
A pressão por desempenho do mercado de trabalho se aproveita dessa mesma fonte para se tornar ainda mais exagerada.
Os profissionais então são incentivados a demonstrar constantemente sua produtividade e resultados, muitas vezes sacrificando o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal.
Isso leva a outro comportamento que culmina nas doenças mentais: a necessidade constante da afirmação do eu em todos os lugares, o tempo todo.
Essa ideia explica a busca pela afirmação de si mesmo como uma maneira de demonstração de valor.
É o conceito do empreendedorismo individual como forma de significação de si mesmo e, portanto, para eu vencer preciso ser melhor que o outro ou melhor que eu mesmo [sic].
E, sendo melhor que muitos e que o eu mesmo de ontem, aí sim terei valor. Do contrário, não tenho valor nenhum.
Inclusive, as redes sociais atuais são o maior retrato desse comportamento.
Nelas o “eu” ganha espaço para mostrar meu melhor lado, minha melhor versão, minhas conquistas, minha vida perfeita etc.
Assim, esses comportamentos e visões de mundo alimentam cobranças exacerbadas e constantes que levam às doenças mentais profundas, fazendo elas se tornarem cada vez mais comuns.
Isso também se deve porque nesse cenário se eu não conseguir, é uma falha minha.
Eu sou responsável pelo meu sucesso ou fracasso, caso não me esforçar “suficiente”.
Esse é aliás o mecanismo de defesa da base da sociedade do cansaço, pois ela vem empacotada em um ideal de liberdade onde o “eu” tudo pode, se quiser e trabalhar “suficiente”.
Assim, a positividade tóxica do tudo é possível independente de fatores externos, impede antídotos diretos contra os fundamentos da sociedade do cansaço, ou mesmo alguma crítica contra ela.
Sociedade do cansaço: As doenças mentais “comuns”
As doenças mentais que surgem desse emaranhado de cobranças, alto desempenho e afirmação do eu vem aparecendo cada vez mais.
As mais conhecidas são:
Depressão
A constante pressão por desempenho pode levar ao desenvolvimento de depressão.
A sensação de inadequação e o medo do fracasso podem corroer a saúde mental dos trabalhadores, levando a sentimentos de tristeza, desesperança e falta de energia.
Burnout
O burnout é uma consequência direta da sobrecarga de trabalho e estresse crônico.
Na sociedade do cansaço, onde a linha entre trabalho e lazer se torna cada vez mais tênue, os indivíduos correm o risco de esgotamento físico e emocional, resultando em burnout.
Ansiedade
A ansiedade é outra condição comum associada à sociedade do cansaço.
A constante preocupação com o desempenho, o medo do fracasso e a incerteza em relação ao futuro podem desencadear crises de ansiedade debilitantes nos trabalhadores.
Transtorno do déficit de atenção
O aumento das demandas multitarefas e da pressão por resultados rápidos pode contribuir para o surgimento do transtorno do déficit de atenção.
Na busca incessante por eficiência, os indivíduos podem encontrar dificuldade em manter o foco e a concentração necessários para realizar suas tarefas.
Existe um antídoto para a sociedade do cansaço?
A sociedade do cansaço cria um ambiente propício para o surgimento de doenças mentais no mercado de trabalho.
Lidar com suas características é um desafio, mas nesse caminho é imperativo que os empregadores reconheçam os sinais de esgotamento e promovam uma cultura de equilíbrio entre trabalho e vida pessoal.
Além disso, os indivíduos devem buscar apoio e cuidados adequados para proteger sua saúde mental em um mundo cada vez mais exigente e competitivo.
Sobre o autor de Sociedade do Cansaço: Byung-Chul Han
Byung-Chul Han é um renomado filósofo nascido na Coreia do Sul, cujas obras têm influenciado profundamente o debate sobre a sociedade contemporânea.
Nascido em 1959, Han posteriormente se estabeleceu na Alemanha, onde realizou seus estudos acadêmicos.
Ele começou sua jornada acadêmica estudando Filosofia na prestigiada Universidade de Friburgo, na Alemanha.
Mais tarde, Han ampliou seus interesses acadêmicos, explorando também a Literatura Alemã e a Teologia na Universidade de Munique.
Sua formação acadêmica culminou em um doutorado em Filosofia, concluído em 1994 na Universidade de Friburgo, com uma tese notável sobre Martin Heidegger.
Após completar sua formação, Byung-Chul Han embarcou em uma carreira acadêmica notável.
Ele se tornou professor de Filosofia e Estudos Culturais na Universidade de Berlim, onde suas ideias e ensinamentos têm sido amplamente reconhecidos e respeitados.
Além de sua atuação como educador, Han é um autor prolífico, tendo escrito numerosos livros que lançam luz sobre os desafios e dilemas enfrentados pela sociedade contemporânea.
Suas obras são conhecidas por sua análise crítica e perspicaz dos aspectos culturais, sociais e filosóficos do mundo moderno.
Entre suas obras mais destacadas está “A Sociedade do Cansaço”, publicada em 2010, que oferece uma visão provocativa sobre a cultura do desempenho e suas implicações para a saúde mental e emocional.
Han também é autor de diversas outras obras publicadas pela Editora Vozes, que abordam temas que vão desde a tecnologia até a psicopolítica.
Com sua erudição, perspicácia e capacidade de comunicação, Byung-Chul Han continua a ser uma figura proeminente no mundo da filosofia e dos estudos culturais contemporâneos, fornecendo insights valiosos e desafiadores sobre a condição humana na era moderna.
Referências
HAN, Byung-Chul. Sociedade do cansaço. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2015.
Management 3.0. Disponível em: <https://faberhaus.com.br/management-3-0/>. Acesso no dia da postagem.
Conselho Nacional de Saúde. Ministério da Saúde. Transtornos mentais e adoecimento no ambiente de trabalho: como enfrentar?. Disponível em: <https://conselho.saude.gov.br/ultimas-noticias-cns/2985-transtornos-mentais-e-adoecimento-no-ambiente-de-trabalho-como-enfrentar>. Acesso no dia da postagem.
Sociedade do Cansaço. Brasil Escola. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=50-Qp9TlwpA&t=565s>. Acesso no dia da postagem.
Byung-Chul Han e a Sociedade do Cansaço. Thaís Lima. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=kFB5BtYSUbY&t=345s>. Acesso no dia da postagem.
Sociedade do Cansaço. Amazon. Disponível em: <https://www.amazon.com.br/Sociedade-do-cansa%C3%A7o-Byung-Chul-Han/dp/8532649963>. Acesso no dia da postagem.