A crise de identidade nos assola cada vez mais nesse mundo onde o trabalho parece definir quem somos e tudo que somos, mas há maneiras de lidarmos com isso.
Veja, quando nos apresentamos, a primeira pergunta que surge é: “O que você faz?”. E apesar de parecer simples, essa questão pode carregar uma carga emocional gigante.
Afinal, e se aquilo que fazemos profissionalmente não for mais o suficiente para nos representar? E se perdermos o emprego ou decidirmos mudar de carreira? Como fica nossa identidade?
Mesmo assim, a sociedade, as redes sociais e, até mesmo, nossas próprias expectativas colocam o trabalho como o centro da vida.
Mas e se disséssemos que é possível pensar diferente?
O peso da sociedade e da autocobrança versus a impermanência da vida para lidar com a crise de identidade
A pressão é real. A cultura atual glorifica o sucesso profissional e transforma a produtividade em uma medida de valor pessoal.
Quem nunca se sentiu culpado por não estar trabalhando o suficiente ou por não ter atingido aquela promoção tão esperada?
O problema é que essa pressão nos empurra para um ciclo perigoso: quanto mais nos definimos pelo trabalho, maior o medo de falhar.
Isso nos deixa vulneráveis à melancolia, à ansiedade e até mesmo à depressão quando algo sai do esperado.
Afinal, se quem você é está tão ligado ao que você faz, qualquer erro pode parecer um fracasso completo, o que pode levar a uma crise de identidade profunda.
Pode parecer estranho, mas para lidar com isso o professor Arthur C. Brooks trouxe uma reflexão poderosa inspirada na “Maranasati Death Meditation”.
A também conhecida como “meditação sobre a morte”, é uma prática budista que envolve contemplar a inevitabilidade da morte para cultivar uma apreciação mais profunda da vida e reduzir o apego aos medos que levam ao sofrimento.
Os nove estágios tradicionais da meditação Maranasati envolvem contemplar as diferentes fases da decomposição de um corpo após a morte.
Esses estágios são:
- Corpo inchado, azul e em decomposição: Refletir sobre a transformação inicial do corpo após a morte.
- Corpo sendo consumido por animais e vermes: Contemplar como o corpo serve de alimento para outras formas de vida.
- Esqueleto com carne e sangue, mantido pelos tendões: Visualizar a progressão da decomposição, onde restam partes do corpo.
- Esqueleto sem carne, mas ainda com manchas de sangue, mantido pelos tendões: Observar a continuidade da decomposição, com a carne desaparecendo.
- Esqueleto sem carne e sem manchas de sangue, mantido pelos tendões: Perceber o esqueleto limpo, ainda íntegro.
- Ossos soltos, espalhados em todas as direções: Imaginar os ossos separados e dispersos.
- Ossos brancos como uma concha: Visualizar os ossos tornando-se brancos com o tempo.
- Ossos com mais de um ano, empilhados juntos: Refletir sobre os ossos antigos acumulados.
- Ossos decompostos, reduzidos a pó: Contemplar a transformação final em pó, simbolizando a impermanência completa.
Durante a meditação somos imbuídos a pensar sobre a insignificância de muitas coisas que valorizamos excessivamente ao nos depararmos com a inevitabilidade do nosso próprio fim.
E, mesmo soando negativo, o resultado da meditação costuma levar a paz e a ressignificação das coisas que realmente vão nos importar.
Brooks adaptou essa meditação para o medo de fracassar no trabalho, sugerindo nove passos que nos convidam a refletir sobre o fim da nossa carreira profissional.
Os 9 passos propostos pelo professor Brooks são:
- Eu sinto que estou perdendo minha relevância no trabalho.
- As pessoas estão começando a fazer observações negativas sobre meu desempenho.
- Eu acredito que serei substituído em breve.
- Eu tenho certeza de que o final da minha carreira profissional está próximo.
- Eu tenho que me aposentar, mesmo que não seja algo que eu queira fazer.
- Eu fui forçado a sair da empresa e não acredito que as pessoas vão se lembrar de mim pelo meus excelentes resultados e contribuições.
- As pessoas no trabalho já nem sabem quem eu sou, e tem apenas seis meses que sai de lá.
- As pessoas pensam em mim como uma pessoa aposentada já sem valor para contribuir no contexto delas.
- Na maioria dos dias eu nem penso nas coisas que eu costumava fazer naquele contexto.
Embora pareçam negativos, Brooks nos lembra que isso é apenas a vida normal. É natural que nossas contribuições profissionais mudem com o tempo.
Quando aceitamos isso, o medo diminui, e nos abrimos para construir coisas boas em diferentes e novos contextos.
Imagine que, por exemplo, você está enfrentando uma transição profissional ou pensando em como o trabalho tem impactado sua identidade, você pode repensar nisso como uma oportunidade.
Isso porque sair do trabalho formal não significa o fim da sua relevância, pode ser o início de um novo capítulo.
Projetos pessoais, trabalho voluntário, hobbies ou até mesmo explorar novas áreas podem trazer um novo sentido no âmbito profissional.
É uma chance de repensar o que realmente importa para você, sem a pressão de corresponder às expectativas alheias.
Dicas para lidar com a crise de identidade profissional
Algumas dicas podem ajudar a lidarmos com essa crise de identidade tão atrelada a carreira profissional.
- Redefina o sucesso: Sucesso não precisa ser apenas uma promoção ou um aumento de salário. Pode ser aprender algo novo, ajudar outras pessoas ou encontrar um melhor equilíbrio entre trabalho e vida.
- Diversifique sua identidade: Você é muito mais do que seu trabalho. Valorize suas relações, paixões, talentos e experiências fora do ambiente profissional.
- Pratique a vulnerabilidade: Compartilhar seus medos e desafios com pessoas de confiança pode aliviar a pressão e gerar conexões mais autênticas.
- Aprenda com o fracasso: Todo erro carrega uma lição. Encare os desafios como oportunidades de crescimento, não como sentenças definitivas.
- Dê espaço para novos significados: Use transições na carreira para explorar o que realmente te faz feliz. Pode ser uma nova paixão ou até um negócio próprio.
Também é importante compreender que definir-se pela carreira pode ser tentador, mas também limitante.
A vida é rica em possibilidades e o trabalho é apenas uma parte do que você é.
Ao aceitar que nossa relevância profissional no mercado formal é transitória, abrimos espaço para criar significados e nos reconectar com o que realmente importa.
Seja gentil consigo mesmo.
Dê passos para explorar outras áreas da vida e lembre-se: você não é apenas o que faz na carreira profissional, mas tudo aquilo que vive, escolhe, experimenta e compartilha.
Referências
Os ciclos da vida. Faberhaus Play. Disponível em: <https://faberhausplay.com.br/ciclos-da-vida/>. Acesso no dia da postagem.
Identity Crisis: Why defining yourself by your career is a problem. Harvard Business Review. Disponível em: <https://youtu.be/L5lsYI0Q8zw?si=1P7pZfE0g7kPYNBb>. Acesso no dia da postagem.
Maranasati Meditation. Facebook. Disponível em: <https://www.facebook.com/photo.php?fbid=682766324059163&id=100069774033485&set=a.373758894959909>. Acesso no dia da postagem.